Pessoas sensíveis e os impactos no ambiente de trabalho

Cresci ouvindo de meus pais, empregadores, colegas e professoras que o mundo do trabalho era algo hostil. A famosa selva de pedra, onde não existia esse negócio de amizade, dó do outro e coisa e tal. Que era preciso ficar ligada: bobeou, dançou. Pressão, gente querendo puxar o teu tapete, te passar a perna: fui apresentada a esse universo de uma forma pouco otimista.

Pior: anos depois do meu primeiríssimo empregão formal, diria que eles não estavam completamente errados. Todas aquelas coisas assustadoras da qual tentaram me alertar realmente aconteceram, mas nem por isso sigo achando que é disso que o mundo do trabalho é feito.

De modo geral, nunca achei que me encaixava muito bem nos ambientes em que trabalhei. Fosse como professora de inglês, revisora de textos ou vendedora de maquiagem em shopping center: eu não tinha aquela “firmeza” que as pessoas esperavam que eu tivesse; pelo contrário, a cada atitude brusca de algum aluno, cliente ou chefe, eu precisava era de um banheiro e uma chave na porta – pra trancar e poder chorar à vontade.

Era algo que transbordava, sem eu entender muito bem por que.

A sensibilidade (ainda) é pouco apreciada

Embora a gente fale cada vez mais sobre humanização e empatia, a sensibilidade ainda é um traço que coloca alguns gestores e líderes em dúvida no ambiente de trabalho.

Uma funcionária sensível certamente dá mais trabalho do que uma “durona”, pois exigirá mais do próprio gestor: logo, ser grosso, fazer piadinhas “inofensivas” ou falar uma frase meio descabida poderá tornar o ambiente desconfortável.

Por um lado, essa exigência ao cuidado com o que se diz pode ser algo bom, ainda mais se o gestor estiver disposto a aprender: pessoas sensíveis são, por natureza, uma lição de paciência e compreensão. Por outro, traz inquietação e desconfiança.

Nas empresas, costuma ser comum ouvir que “Fulana é muito sensível”, que “Não dá pra contar com tal pessoa na tomada de decisões porque ela vai pesar muito o lado emocional da coisa” etc. Isso não deixa de ser verdade.

Por onde passei, ouvi coisas do tipo: “Não comente isso com a Patrícia, hein, porque sabe como é, qualquer coisa assim ela já enche o olho d’água…”.

Ser extremamente sensível me rendeu rótulos e já atrapalhou muito a minha rotina de trabalho – o que não significa que essa característica não possa ser utilizada para o bem.

Há muitos mitos envolvendo as pessoas sensíveis.

Não ser bem vista no seu ambiente de trabalho porque você não tem controle das suas emoções é uma coisa. Não ser bem vista porque você simplesmente “é sensível” é completamente diferente.

Como a (falta de) sensibilidade pode afetar a sua empresa?

Em 2007, o sociólogo Zygmunt Bauman clareou nossas mentes com uma explicação que acho válida até hoje: vivemos tempos líquidos. Tudo está passando muito rápido, e fica cada vez mais difícil estreitar relações, parar e olhar o outro. Pense bem: se a sensação, há mais de 10 anos, já era essa, a ponto de ele ter escrito um livro inteiro dedicado a essa questão, imagine como estamos agora!

Nesse sentido, as pessoas mais sensíveis funcionam como elo entre os outros. Como ponte. Boas observadoras, elas não invisibilizam quem é diferente: enxergam valor em todos os tipos de pessoas, não importa hierarquia, condições financeiras, questões de classe, nada disso.

Elas vão se destacar justamente por não esquecerem do que é simples, e mesmo na correria, ainda encontrarão tempo para dar bom dia ao porteiro, para olhar alguém nos olhos, para ouvir com calma quem precisa falar. São boas para propor soluções e lidar com assuntos difíceis, delicados, que, hora ou outra, surgirão no ambiente de trabalho.

Afinal, por mais que seja preciso bater a meta, ainda estamos falando de pessoas, certo?

São tantas mudanças desde que o mundo é mundo, é tanta informação, é tanta coisa que antes cabia em fórmula pronta e agora precisa ser revista… a falta de sensibilidade, em um mundo que pede mais atenção, pode ser grave.

A falta de cuidado com o outro pode impactar diretamente na produtividade da sua empresa: porque pessoas que se sentem pouco importantes produzem menos. Engajamento de colaboradores tem que deixar de ser objetivo estipulado no papel e ganhar a prática: porque quem não se sente bem não abraça a causa da empresa e não dá o seu melhor.

Saber ouvir e identificar as necessidades alheias: isso não pode ser visto como perda de tempo, se o que você quer é ver a sua empresa crescer. E é aqui que entra o grande diferencial das pessoas mais sensíveis.

O trunfo das pessoas sensíveis

Pessoas sensíveis são amáveis. E sim, elas podem realmente demorar mais para tomar uma decisão, mas provavelmente saberão falar melhor com alguém sobre algo doloroso. Elas podem se emocionar e se perturbar ao entrarem no escritório e ouvirem piadas machistas ou uma notícia de estupro como se estivessem falando de tomar café, mas provavelmente serão aquelas que passarão mais credibilidade quando for necessário encarar uma dor, tamanha capacidade de se colocar no lugar do outro.

Elas antecipam aquilo que a sociedade precisa e por isso, podem ser muito bem-sucedidas.

Em palestra do RD Summit ano passado, a futurista Beia Carvalho afirmou que esses empregos automatizados, em que as pessoas parecem tão robóticas e desconectadas – não só de si mas de um propósito em geral -, está com os dias contados. É preciso acompanhar as mudanças comportamentais.

O cenário será incrível para as pessoas flexíveis, criativas e cheias de sensibilidade. Nesse sentido, pessoas sensíveis saem na frente porque nasceram com uma habilidade que muitas estão tentando aprender: empatia.

Chegou a vez dos famosos “bons de coração” e de esquecer a rivalidade, a disputa. O futuro é colaborativo. Modelos tradicionais caem por terra porque já se sabe que todo mundo tem algo a ensinar. Logo, empresas que não estiverem alinhadas com essa nova energia sentirão sua sólida estrutura balançar.

Por isso, quando alguém te parecer sensível demais, não menospreze. Acolha essa pessoa diferente no teu time. Por mais que os robôs tenham sua importância, não queremos atitudes robotizadas em pessoas de verdade. Pessoas sensíveis são um resgate do óbvio e do que existe de mais humano em todos nós.

É duro escrever isso, mas vivemos tempos em que até o óbvio precisa ser dito.

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