~Por que você tá se metendo com política? Seu conteúdo não é sobre pessoas altamente sensíveis (PAS), saúde mental e escrita criativa?~, me perguntou alguém por mensagem privada, após eu convidar pessoas que apertaram 22 no primeiro turno para conversar.
Sim, meu conteúdo é sobre tudo isso que foi citado. Mas viver, por si só, é um ato político. Todas as nossas ações e escolhas denotam posicionamento e formas de enxergar.
Entendo, porém, o ranço com a palavra ~política~, tanto no feminino quanto no masculino.
Falar de política faz a minha mãe revirar os olhos. Ela sai da sala quando alguém toca no assunto. Meu pai parece calmo, mas perde as estribeiras quando assiste ao noticiário e aos escândalos da corrida eleitoral. Meu avô é a pessoa com quem mais consigo falar sobre política, desde que seja para criticar.
Não fomos ensinadas a tratar de política com naturalidade e interesse. Adotamos rótulos e nos agarramos a eles: ~todo político é corrupto~, ~que saco esse negócio de eleições~, ~política não se discute~, ~não gosto de política~, ~não quero me envolver para não causar briga~ etc.
Eu mesma ignorei a política por alguns anos. Não queria saber. Preferi ficar presa aos achismos e às ~vozes da minha cabeça~, até que decidi ouvir pessoas mais engajadas e comecei a estudar.
BAH!
Foi aí que minha cabeça, sempre tão dura, explodiu.
Não querer saber de política também é um ato político
Você já parou para pensar que faz política o tempo todo? Pois é. Todas as nossas relações sociais e comportamentos passam pela política, que, em vias rasas, pode ser considerada a arte de negociar para o bem comum.
Essa negociação envolve relações de poder e nossos interesses. Vejamos um exemplo tosco do dia dia: uma adolescente decide pedir dinheiro a seus pais. É garantido que ela o terá? Não. Para conseguir o que deseja, ela necessita autorização e aqui entra a política de uma boa conversa, por meio de argumentação e fatos. Os pais, tomadores de decisão, irão avaliar a situação.
Entre outros pontos, política é discussão e questionamento para se chegar a algum lugar.
Mais um exemplo: a roupa que você escolhe usar também é uma questão política. Como?
O consumismo possui um contexto para cada pessoa. Ou seja, quando prefere uma marca em detrimento de outra (e pode pagar por ela), inconscientemente você comunica uma parte da sua realidade e dos seus privilégios. Indo um pouco mais fundo:
O fato daquela sua amiga descolada conseguir comprar apenas roupas de moda consciente (cujos valores assustam) ao invés de ir numa Riachuelo da vida, é político, pois significa que vocês não têm acesso às mesmas condições econômicas.
Olha como tudo isso se relaciona: para comprar uma calça na pegada slow-fashion-sustentável-estilo-alfaiataria, sua amiga vai desembolsar cerca de R$ 300 reais. Logo, pressupomos que ela ganha relativamente bem e que essa quantia não vai abalar o mês.
Se ela ganha relativamente bem, é porque, provavelmente, teve acesso à educação de qualidade. Se ela pôde estudar, significa que teve uma vida razoavelmente planejada, com pais que puderam investir no futuro dela.
Tudo isso passa por processos políticos, que podem ou não favorecer o desenvolvimento e o acesso às oportunidades.
Quando apenas uns poucos possuem oportunidade de crescer e se desenvolver, é preciso questionar. Para questionar e argumentar, precisamos de política.
O que você vê (e da onde você vê) é político. Pense: onde você mora? Por onde passeia? Aliás, você passeia? Você tá olhando de uma janela de vidro com vista para o mar, num condomínio seguro ou a sua vista é da quebrada, com tiroteio a qualquer hora do dia? Você mora de aluguel? Tá conseguindo, mesmo com a crise, comprar a carninha sagrada do fim de semana?
O que você come ou escolhe não comer é político. Não dá para fugir: mesmo não gostando e querendo manter neutralidade (a paz disfarçada), você já está fazendo política. Política é instrumento de ação e todo santo dia, nós agimos em prol dos nossos interesses (ou tentamos), certo?
Certo.
Impactos do resultado do primeiro turno: polarização, ascensão do bolsonarismo e a arrogância da esquerda
Eu tenho lado, sim, mas não sou despirocada. Procuro olhar todos os ângulos e sair do raso. Não vale dizer que 51 milhões de pessoas que digitaram 22 são incapazes de raciocinar: elas têm seus motivos, por mais que pareçam esquisitos àquela parcela da população que apertou 13.
O resultado do primeiro turno me deixou muito pensativa. É uma divisão sem precedentes, que demonstrou vários pontos importantes para discussão da nossa existência coletiva.
Além da polarização: como se desprender da sua visão de mundo
Separei algumas perguntas para chacoalhar o seu cérebro e ajudá-lo a ir além da polarização e do ~quem votou 22 é do mal~. Não se trata de bom e mau. É mais amplo do que isso. Pensa comigo:
- Quais valores estão fortemente arraigados na ~família tradicional brasileira~?
- Quantas pessoas que você conhece tiveram a chance de estudar e se aprofundar? Quantas têm o hábito de ler?
- Por que é mais fácil acreditar no que chega pelo WhatsApp que ir atrás das fontes, checar?
- Por que aquele seu tio querido tem tanto medo de um ~retorno à ditadura~? Tem alguma coisa no governo atual lembrando o horror vivido no Brasil a partir de 1964?
- Por que o seu chefe defende o uso de armas e expõe bandeiras do Brasil na sacada de casa? Será que ele sabe o que isso significou, anos atrás, no fascismo italiano?
- Qual a dificuldade de dialogar com quem pensa diferente? Por que estão atribuindo ódio ao pessoal de direita e achando que os de esquerda possuem uma visão melhor? Melhor para quem? Da onde saiu tudo isso?
- Estão dizendo que o PT é corrupto e que o PL odeia as mulheres: por quê?
- Se ser cristão é ser a favor do amor, como explicar o atual presidente defendendo a tortura?
- Por que estão misturando religião e política? Isso não seria manipulação?
Comece a desenrolar seu pensamento como se você fosse uma criança na fase dos ~por quês~.
É preciso entender que a polarização não contribui para o debate. Polarizar é acreditar que seremos salvas por um partido, por uma figura política que tomará as rédeas da nossa vida. É desacreditar da nossa capacidade analítica. É como se estivéssemos de mãos atadas.
Para os políticos, quanto mais a gente se divide, melhor: assim é mais fácil de sermos controladas.
Já percebeu que o comportamento social nas eleições não parte de um raciocínio lógico mas de reações emocionais, inflamadas, que geram identificação?
Não é à toa que vemos, desde 2018, o fortalecimento do bolsonarismo.
Muito além de esquerda e direita: o bolsonarismo veio para ficar
~Você é de esquerda ou de direita?~: maldita pergunta!
Quanto mais estudo, mais nervosa fico com essa dicotomia. Tenho entendido que na Europa, faz sentido essa distinção. No Brasil, é uma bagunça.
Fui atrás da origem dos termos, mesmo assim. E embora o Brasil seja essa zona que estamos vendo, falar em esquerda e direita pode elucidar alguns pontos para quem é leigo.
Segue o contexto: era uma vez, na Revolução Francesa, o rei Luis XVI. Durante uma assembleia para discutir como ficariam as coisas no governo dele, uma parte do povo sentou no lado direito e outra, no lado esquerdo do salão.
Do lado direito, ficaram aquelas pessoas que desejavam mais poderes ao rei. Elas desejavam que as mudanças fossem lentas, graduais e que tudo ficasse mais ou menos como estava. Idealizadoras do passado, queriam manter a ordem.
Do lado esquerdo, havia um pessoal doidinho por mudanças, querendo limitar o poder real e abolir a monarquia. Queriam transformações imediatas na sociedade, eram idealizadoras do futuro. Queriam uma nova ordem, e para isso, seria preciso um pouquinho de caos, afinal, toda mudança envolve romper com o habitual, com o que é confortável.
Pronto: a origem da briga entre esquerda e direita foi essa.
Agora deixo um infográfico muito bem feito para ampliar a sua visão sobre os dois termos.
[Crédito: infográfico retirado do site Politize!].
Tá vendo como é complicado aplicar a noção de esquerda e direita no nosso país? Há muitas possibilidades no meio.
Mas, se tem algo que não me deixa em dúvida e que ficou escancarado no primeiro turno, é a força do bolsonarismo.
Ideias conservadoras, que envolvem a estimulação de um pensamento único, a reestruturação de elementos tradicionais, o culto à força, a desconfiança do sistema democrático (sobretudo de urnas e consultas populares), a defesa da meritocracia e a divisão da sociedade em ~bons~ e ~maus~, como se fossemos todos indivíduos duais, são as principais características do bolsonarismo.
Eu me entristeço diante dessas ideias. De verdade. Dói em mim de uma forma que mal consigo explicar. Mas é fato que pelo menos 51 milhões de brasileiros as apoiam.
Você pode até não gostar de Bolsonaro, mas não pode negar a força do seu discurso. Ele sendo reeleito ou não, o bolsonarismo continuará existindo. Na minha visão, é um movimento que deixa marcas profundas na psique da nossa sociedade.
A esquerda academicista e cheia de razão cria afastamento
Venho do mundo acadêmico. Sabe como é: graduação, especialização, mestrado, doutorado, aquela coisa toda. Abandonei um doutorado completamente pago porque, entre outros motivos, não suportava a arrogância dos corredores.
Quanto mais estudamos, mais informadas ficamos. Mas isso não nos dá o direito de passar por cima de quem não teve o mesmo acesso que nós.
É tolice da parte de quem estudou, tratar o outro com distância.
Sei que tem horas que dá raiva. Tem momentos que a vontade é de gritar um ~VAI ESTUDAR, C*R*LHO, VAI LER UM LIVRO DECENTE!~, mas isso não ajuda.
O efeito é reverso quando há exaltação: a pessoa, acuada, vai em direção ao que ela já está acostumada, e você, sabichona, fica ainda mais irritada.
Um exemplo comum nessas eleições tá sendo o uso de termos complexos, como ~fascista~ e ~genocida~ para falar com aquela tia bondosa que nem terminou o segundo grau. É preciso um pouquinho mais de humildade.
A arrogância do pessoal de esquerda afasta, assusta, incomoda. Debochar de quem se afilia a ideias de extrema-direita é dar um tiro no pé, sabe por quê? Porque por mais que você tenha vindo da academia e lido diversos livros, e saiba argumentar, e por mais que Lula ganhe e você fique feliz, a luta não vai acabar.
Olha as bancadas no Congresso: os ex-ministros de Bolsonaro chegaram facilmente ao poder com discursos que geram aproximação. As pessoas se reconhecem neles. Enquanto isso, a galera da esquerda se mostra incapaz de ouvir o que eles têm a dizer. Não seria mais produtivo aproveitar todo o seu currículo acadêmico de outra forma, SEM violência?
Não é fácil. Não tô dizendo que tudo se resolve com amor. Tem dias que eu me canso e vou lá no ~Zap~ reclamar com amigos que pensam parecido. Ninguém é de ferro.
Estou apenas sugerindo outras rotas, porque o caminho que temos tomado, buscando alertar através de insultos e humilhações, não tá funcionando.
É possível dialogar sem ofender: lidando com quem discorda de você
Nas últimas semanas, conversei com várias pessoas que votaram em Bolsonaro, buscando entender suas motivações. Sem fanatismo: conversei com pessoas dispostas e isso fez toda a diferença.
Com fanáticos, sinto muito, não há diálogo possível. Mas se você se deparar com pessoas que discordam de você educadamente, vale a pena ouvi-las.
Minha sugestão é sempre a mesma: faça perguntas. Não dê respostas, não dê sermão, não diga que ela é burra e não consegue enxergar a realidade dos fatos. Porque aqui, já temos uma nova questão: que realidade é essa que eu enxergo e você não? Só existe uma realidade possível?
Pergunte de forma específica, como sugeriu a Barbara Monteiro neste post. Dê ao outro a chance de pensar como responder. Não o atropele. Segura aí essa vontade de rebater.
Aos poucos, você conseguirá reunir dados e informações interessantes para avaliação. Não sou nenhuma pesquisadora acadêmica, sou apenas curiosa e praticante da escuta ativa.
Ouvir sem julgar e sem devolver com pancada é um exercício dificílimo, ainda mais quando o assunto mexe com seus valores pessoais, então encare como um teste de inteligência emocional. Aguente firme.
Além das pessoas com quem conversei pelo LinkedIn, fui atrás de tentar compreender as razões de amigos queridos que votaram no atual presidente. É dolorido achar que você e pessoas que você ama partilham das mesmas visões e descobrir que opa!, não é bem assim.
De uma amiga que tem filha pequena e apertou 22 no primeiro turno, ouvi o seguinte: ~Estou preocupada com o futuro da minha filha. Quero dar a ela uma boa educação e para mim Bolsonaro se mostrou seguro nas próprias atitudes. Ele é decidido, passa uma coisa boa~.
Eu insisti e o diálogo seguiu mais ou menos assim:
– Ok. Mas o que significa uma boa educação para você?
– Ah, você sabe. Como nossos pais nos educaram. Somos corretas, éticas, estudamos e tudo o mais.
– Sei… entendi. Só não concordo que o atual presidente seja uma boa referência. Ele é decidido, sim, mas não gosto do jeito que ele fala das mulheres, dos pobres, dos trabalhadores. Isso não te preocupa? Você tem uma menina.
– Ah, um pouco… às vezes ele é meio bruto, fala umas asneiras. Mas é o menos pior dos piores. No fim, você sabe que não ligo muito pra política.
Encerrei pouco depois porque a realidade dela estava clara para ambas. Refleti sozinha: por que ela ligaria para política, se tem um cargo bom, ganha bem, não convive com a classe trabalhadora, vai de carro a qualquer lugar e recentemente comprou a própria casa? E mais: ela não é a única da família a ter essa vida. Logo, seu grupo social vive os mesmos privilégios.
Nada disso significa que ela é má pessoa. Significa apenas ignorância política e a vivência de uma realidade que não é a mesma para milhões de brasileiros.
A ignorância política tem consequências graves e dói demais, mas dói apenas em quem consegue sair da própria bolha.
Tenho certeza que minha amiga não compactua com muitas das ideias bolsonaristas, mas o fato de ignorar a política e votar naquele que julga, a partir de sua ótica, o ~menos pior~, pode passar a impressão de que ela é alguém que não se importa com o próximo.
E aqui temos o pulo do gato: ela se importa com o próximo, se for próximo dela. Eis a influência das pessoas que nos cercam e a necessidade de entender sobre política e afeto.
Política é um jogo afetivo: o apelo ao sagrado e os valores pessoais de cada um
Sou completamente apaixonada por mulheres que estudam política. Aprendo muito com a Mirelle (fuce os destaques do perfil para abrir sua mente!) e a Jessica Petit. Inclusive, foi com elas que entendi o perigo da arrogância da esquerda.
Mas voltando à questão do afeto. Jessica explica que as pessoas não brigam por política, e sim por bandeiras. Essas bandeiras traduzem parte da identidade de cada um. Isso ficou claro em algumas respostas que recebi: ~Apertei 22 porque sou cristão~, ~Votei 22 porque minha família é tudo para mim~ e por aí vai.
Analise: quais as bandeiras levantadas por Bolsonaro? Deus, pátria, família. Essas bandeiras mexem profundamente com o imaginário da humanidade (alô, fascismo e nazismo!) e geram identificação instantânea porque: 1. o catolicismo é a religião majoritária no Brasil; 2. o patriotismo causa a sensação de amor, honra e servir ao país; e 3. a família tradicional brasileira não deve ser desintegrada (leia-se ameaçada por novos modelos familiares).
As pessoas escolhem seus candidatos baseadas em seus afetos e grupos sociais. Se para minha amiga, a filha vem em primeiro lugar, e uma das falas de Bolsonaro é articulada em cima da família, ela ficará do lado dele. Se a filha dela foi batizada no catolicismo, mais forte ainda é a sua crença no que o atual presidente prega.
Jessica Petit descreve que as pessoas lutam pela manutenção da própria identidade. Ou seja, tudo aquilo que elas não são ou que pode causar estranheza, será rejeitado, caso elas não desenvolvam a autoconsciência.
Minha amiga está apegada ao que ela conhece e não tem interesse em ir além de sua própria realidade, no sentido de não querer entender como funciona o banheiro para pessoas ~trans~ e o que realmente significa ideologia de gênero. Ela tem medo do que não conhece, o que é compreensível.
O apelo ao sagrado também tem se mostrado eficaz na corrida eleitoral, ainda mais num país como o nosso, em que a religião é pautada pelo medo. As pessoas que conheço e são cristãs fervorosas não vão à igreja porque querem aprender mais sobre Jesus; elas vão à igreja por medo do inferno.
O medo do desconhecido tem seu valor: aprisiona nossa mente, tornando-se uma arma poderosa.
Lembra da Inquisição e da caça às bruxas? Pois é. O que se sabe, hoje, sobre elas? Que andavam voando por aí, em cima de vassouras? Não… se sabe, hoje, que eram apenas mulheres com vasto conhecimento. Numa sociedade que não aceitava mulheres que pudessem ler, isso era amedrontador.
Outro ponto, que venho conversando com uma amiga (oi, Andrea!), tem a ver com nossos valores pessoais.
Muitas respostas para justificar o voto em Bolsonaro vieram acompanhadas de ~honestidade é um valor inegociável para mim~, com acusações ao partido oposto.
É impactante observar como nos agarramos àquilo que julgamos certo.
Quando nossos valores pessoais não estão claros, ficamos confusas. E o pior: aceitamos que os outros nos digam quais valores importam.
Educar a si mesma: o meio mais eficaz de sair da lama (e voltar a ter esperança)
Quando eu ainda era uma ~jovem mística~ despolitizada, curtia muito o discurso da autorresponsabilidade. Achava que só dependia de mim mudar completamente a minha realidade, na hora em que eu quisesse.
Com o passar dos (d)anos, percebi que ser autorresponsável é importante MAS não é a única saída.
Há coisas que não estão ao nosso alcance. O controle é ilusório. A vida acontece independentemente de praticarmos a autorresponsabilidade.
E cá entre nós: se o tiro sair pela culatra, você ainda pode começar a achar que tudo nesse mundo é culpa sua (foi o que aconteceu comigo).
Não estou dizendo que autorresponsabilidade é um negócio ruim: eu é que compreendi errado (olha aí eu sendo autorresponsável neste momento, hahah!). O termo pode causar confusão, por isso, hoje, prefiro falar em educação de si ou autoconhecimento.
Educar a si mesma é estar atenta às suas escolhas e lidar com as consequências de cada uma delas.
É investigar, por conta, o que te parece sagrado, o que te deixa contente, o que te traz alívio. É se perguntar como você pode fazer a sua parte, sem ferir o outro. É seguir um caminho só seu, de preferência, guiado por mais perguntas do que respostas. Quando achamos que temos as respostas, limitamos nosso aprendizado.
[Sim, você é uma fonte inesgotável de material para estudo. Larga mão de preguiça, hein: autoconhecimento é fundamental].
Vamos a um exemplo para reflexão: você segue determinada religião porque pesquisou sobre ela e gostou da ideia ou porque apenas te disseram que, se não seguisse, coisas ruins aconteceriam com você?
Entende o que digo, criatura? Questione-se. Reveja seu caminho. Não nascemos prontas. Não está escrito nas estrelas como você deveria ser.
Por que o hábito de questionar pode te trazer mais esperança e conhecimento sobre si? Porque você perceberá que há possibilidades. Você deixará de depositar e entregar toda a sua vida nas mãos de terceiros, como políticos. Eles são uma parte do nosso cotidiano, não nossa vida inteira.
Sabe quando dizem que se Fulano for eleito, tudo vai mudar? Calma. Algumas coisas irão mudar, com certeza, mas VOCÊ ainda poderá desenvolver consciência e pensamento crítico, a fim de ser alguém melhor. A partir daí, ficará mais claro como você pode colaborar socialmente, apesar do desespero ao seu redor.
Se estamos de acordo com Jessica Petit, ao afirmar que ~não existe coletivo saudável com indivíduos adoecidos~, façamos nossa parte. Cuidemos de nós para poder auxiliar o coletivo.
Sei que você pode estar à beira de um ataque de nervos. Estamos a poucos dias das eleições mais importantes da história desse Brasil. Os ânimos estão agitados, a disputa acirrada e a educação de muita gente foi embora. Temos ultrapassado nossos limites.
Não se veja obrigada a reagir: já é pesado o bastante tudo que você sente. Mas, se houver disposição e paciência, dialogue com quem pensa diferente. Se achar que não dá conta (e eu não te culpo), tudo bem.
Valores não se mudam da noite para o dia.
E daqui para frente?
Queria tanto dizer que vai ficar tudo bem e acalmar seu coração, mas não posso. Assim como você, ando insegura.
Tenho medo do dia 30. Tenho medo do que pode vir depois, em qualquer caso: Lula ou Bolsonaro. Tenho medo de ondas reacionárias mais fortes. Não consigo ver aceitação pacífica do resultado por nenhum dos lados, infelizmente. Tenho torcido para que ninguém saia ferido.
No momento, conscientizar quem ainda se dispõe a aprender é tudo que me ocorre. Não brigar com quem já se decidiu. Não partir para o ataque. E seguir educando a mim mesma, para lidar com as adversidades, até onde o meu limite permitir.
Aumentar as sessões de terapia, abraçar quem eu amo, esmagar meus gatos. Escrever para aliviar as dores físicas e emocionais. Pensar que eu não quero ser conduzida pelas massas. Me educar para ajudar quem não teve a mesma chance que eu. Descer do salto. Tirar o academicismo das costas e falar de igual para igual.
Lembrando, pela última vez: foco em quem consegue debater e ouvir sem se precipitar. Aos fanáticos e impassíveis, ofereça o silêncio. Não aceite o chamado para brigar, não gaste energia à toa.
Na ética do diálogo em que acredito, ainda é possível a gente conversar.